Enfermeiro Especialista em Saúde Materna e Obstetrícia
Serviço de Ginecologia e Obstetrícia
HPA Magazine 22 // 2024
ADIAMENTO DA MATERNIDADE
No passado, a maternidade ocorria entre os 20 e os 30 anos. Por vezes, até antes. O casamento acontecia cedo e a constituição de família estava diretamente relacionada. A mulher raramente tinha ambições de carreira e as funções de doméstica, associadas à maternidade, preenchiam integralmente o seu papel social. Esta tendência inverteu-se e a mulher encontra a sua realização plena noutros campos, adiando a maternidade. E o casamento não conduz de imediato à constituição e alargamento da família. A carreira, a estabilidade material e financeira, a habitação, os planos de viajar sem filhos, a instabilidade profissional, entre outros fatores, remetem a parentalidade para um segundo plano. Por vezes, o facto de encontrar tardiamente um companheiro determina igualmente que o desejo de parentalidade seja adiado.
Atualmente, estima-se que mundialmente cerca de 19% de todas as gravidezes e 11% de primeiras gravidezes ocorrem depois dos 35 anos, sendo a média etária para um primeiro filho de 27,1 anos, em comparação com 21,4 anos nos anos 70.
Em Portugal, a idade média materna para o nascimento do primeiro filho também tem aumentado nos últimos anos. Em 1994 era de 25,4 anos, em 2004 foi de 27,4 e em 2014 foi de 30 anos. Estes dados corroboram um aumento médio de 2,1 anos na idade materna a cada 10 anos, para o nascimento do primeiro filho.
GRAVIDEZ E MENOPAUSA
Apesar do alarme do relógio biológico tocar mais cedo, engravidar depois dos 35 anos é cada vez mais comum e, pelas mais diversas razões há muitas mulheres que o fazem com sucesso aos 40 e 50 anos. A diferença é que o processo de conceção, em vez de ser natural e espontâneo pode ser acompanhado de métodos de reprodução assistida. Isto porque a opção pela maternidade tardia pode ser dificultada pela proximidade da menopausa e as alterações orgânicas que ocorrem nesta fase. Portanto é fundamental compreender como a menopausa afeta a fertilidade, para que a mulher programe a sua gravidez preferencialmente dentro da idade reprodutiva.
A menopausa ocorre no âmbito de uma faixa etária alargada, genericamente entre os 45 e os 58 anos de idade, podendo ocorrer muito antes disso, por razões clínicas diversas (tratamentos médicos e/ou cirúrgicos), só estando definitivamente instituída quando a mulher não menstrua por um período superior a 12 meses.
ENGRAVIDAR AOS 50
Biologicamente a mulher nasce com todos os óvulos de que vai dispor e que vai libertar em cada ciclo menstrual, indo diminuindo até à menopausa, isto é, até terminar a sua idade fértil. Estima-se que no início da puberdade uma mulher dispõe de 500 mil óvulos, cerca de 25 mil por volta dos 30 anos e cerca de mil aos 51 anos. Os óvulos não diminuem só em quantidade como também em qualidade. A pouca quantidade determina a probabilidade em engravidar. A pouca qualidade determina a probabilidade de anomalia genética/alterações cromossómicas. Por isso se compreende a dificuldade em engravidar naturalmente com IMA e a necessidade quase certa de recurso a um especialista em fertilidade. A preservação de óvulos criopreservados colhidos antes dos 35 anos ou o recurso a óvulos doados, podem ser uma solução para uma gravidez adiada. Portanto, não é impossível engravidar aos 50 mas é muito raro e é um processo que envolve sempre um especialista em reprodução medicamente assistida.
De acordo com um estudo efetuado com uma amostra de 58 mil mulheres, ficou demonstrado que com 25 anos, 4,5% das mulheres não conseguiam engravidar naturalmente, o mesmo se passando com 20% das mulheres aos 38 anos, 50% aos 41 anos, 90% aos 45 anos e 100% aos 50 anos. Efetivamente, com o avançar da idade a probabilidade de engravidar diminui drasticamente devido à quantidade e qualidade dos óvulos disponíveis. No entanto, teoricamente, haverá sempre essa possibilidade desde que haja ovulação. Se o ovário produzir um só óvulo viável e ele for fertilizado, terá lugar a conceção. O método de Fertilização in Vitro (FIV) permite a utilização tanto de óvulos próprios como doados criopreservados.
Se faz parte do seu projeto de vida ser mãe e está a planear a sua gravidez na fase em que se considera, pelo exposto, que está em IMA, a idade só por si não constitui um obstáculo absoluto. A medicina da reprodução existe para a ajudar a concretizar esse objetivo. Leve em linha de conta o seu estado de saúde geral, os seus antecedentes clínicos, a medicação da qual depende, pondere a realização de um estudo pré-concecional e agende uma consulta com um especialista em medicina materno-fetal. Apesar de ser uma gravidez de risco existem condições para que decorra de forma saudável, segura e prazerosa, desde que devidamente vigiada e controlada. E sempre consciente dos riscos calculados para si e o feto.